Saturday, September 26, 2009

PROSAMIM: DO MARKETING À INTERDIÇÀO SOCIAL

A moral de classe é um sistema de valores e enunciações hierarquizantes que tem por objetivo estabelecer uma ordem classificatória e segregatória dentro de uma sociedade.

Entende-se daí que esta moral é um mecanismo incorporal de capturação de linhas de produção, que atinge todo aquele que ainda não conseguiu realizar um exame racional da sua condição no mundo. Assim, a classe média incorpora no seu trato social os valores e enunciados das alcunhadas elites, sem no entanto compreender que é justamente este sistema de valores que lhe segrega e estabelece a fronteira divisória da moral do rebanho. A morte do Desejo como produção autônoma, a diminuição da potência de agir e a capturação pelo buraco negro do Significante Despótico.

Claro que um governo que esteja a serviço desta ordem moralizante e que prefira construir armadilhas para seu povo a permitir que as linhas produtivas de comunalidades irrompam livremente irá trabalhar no fortalecimento da segregação pela signagem da moral de classe.

Assim, um povo educado é um povo bem adequado aos ditames do modo de produção do capital. Como é o caso do governo do Amazonas. Evidência profética, diriam alguns, a exibição do déjà vu, diriam os mais atentos, quando anos atrás, o então governador e agora prefeito sub judice, Amazonino Mendes, dava tapinhas à cabeça do então candidato e hoje governador, Eduardo Braga, exclamando “esse é o meu garoto!”. Toda “boa educação” é efeito da subalternidade. Por isso, como afirmam os filósofos Michel Foucault e Antonio Negri, cada um a seu modo, o Estado teme a Multidão. Nela, não há elementos de controle, os signos da dominação moral não encontram território para estabelecerem a troca simbólica.

Como governante bem educado, Braga, bom cristão que é, sabe que “a boa educação começa em casa”. Significa dizer que a família, como elemento propagador da ordem moralizante, cumpriu seu papel de sufocar a maior parte das manifestações de Vida e da potência de agir de seus membros. A neurose familiar, como bem mostrou o antipsiquiatra David Cooper, quando mostra que, nas famílias bem ajustadas, não é a “ovelha negra” mas sim o filho exemplar, o que mais exibe os sintomas da interdição.

PROSAMIM: DO MARKETING À INTERDIÇÃO SOCIAL

Como já mostrado neste bloguinho, o Prosamim carrega menos elementos de transformação social efetiva num plano constitutivo de uma cidade que de ação marketística de ordenamento hierárquico tocado a golpes de fórceps. Já ficou claro que num plano cosmético – a cosmética da assepssia social – o programa é um sucesso, quando o quesito é mover num plano físico os problemas sociais fermentados sob décadas de miserabilidade sustentadas pelos governos.

Quando os agentes governamentais tentam cobrir a ferida social aberta com o programa, que apenas transporta a violência e a ausência de perspectivas de desenvolvimento econômico para as famílias, num estado onde a economia é apêndice, fica claro a predominância da imagem do pensamento do Estado.

Daí os agentes do Prosamim tomarem os efeitos pelas causas, e proporem cursos de boas maneiras (a chamada “etiqueta”) para os moradores transferidos. São temas anódinos e expressivos da incapacidade do Estado em atender as reais demandas sociais de uma cidade que não se fez cidade. Evidência da incapacidade dos governos que passaram e os atuais em ver que que “os pobres se esquivam pelas barreiras e cavam túneis que enfraquecem as muralhas” (Toni Negri).

Uma ilustração é o próprio Prosamim: na área onde tudo foi ‘reurbanizado’, e que passa por baixo da ponte Benjamin Constant, a ponte metálica, enquanto toda a estrutura para um parque fica à míngua, e vários quiosques de comércio apodrecem à espera de que algum apadrinhado das secretarias estaduais/municipais tomem conta, do outro lado, na Av. São João, na Santa Luzia, os moradores do Parque Residencial Jefferson Péres transformaram o calçadão em mini-shopping, com venda de bebidas, roupas, bares e até uma danceteria.

Longe da submissão aos ditames da moral de classe e do controle social dos governos, a população mostra que não precisa que lhe mostrem o que é bom. Basta que abram o caminho e ela mesma o faz.

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